15/02/2019

Subsídios para a caracterização do gestor público (IV)

DOM UBU: P’la minha candeia verde, já sou rei deste país. Já apanhei uma indigestão e vão agora trazer-me a minha grande capelina.
DONA UBU: E é feita de quê, Dom Ubu? Podemos bem ser reis, mas temos que ser poupadinhos.
Alfred Jarry – Rei Ubu (Acto III, cena 1)
Trad. Luísa Costa Gomes

13/02/2019

Subsídios para a caracterização do gestor público (III)

Ninguém menos é rei, que quem tem reino.
Ah, que não é isto estado, é cativeiro
de muitos desejado, mas mal crido,
üa servidão pomposa, um grã trabalho
escondido sob nome de descanso.
António Ferreira – Castro (Acto II, cena 2)

12/02/2019

Subsídios para a caracterização do gestor público (II)

O vienense é um aguentador de primeira. Cá na nossa terra suportam‑se todos os sofrimentos como se fosse um divertimento.
Karl Kraus – Os Últimos Dias da Humanidade (Acto I, cena 11)
Trad. António Sousa Ribeiro

Subsídios para a caracterização do gestor público (I)

Todo o gestor público se assemelha a Jocasta. Isto não significa que sejam todos iguais, como se diz dos homens. Confrontada com o horror e a ignomínia, a Jocasta de Sófocles entra no palácio, fecha as portas e enforca-se. Já a Jocasta de Eurípides, bem, essa aguenta tudo.

11/02/2019

«A coisa mais profunda que Hamlet disse»

Cumpriu-se agora um ano sobre o meu início de funções como gestor público – aquilo que, no português desembaraçado das redes sociais, se designa por um tacho. O tempo, esse bem de primeiríssima necessidade, desatou a escassear e raramente tenho agora a oportunidade de me abandonar à leitura – à leitura de outras coisas que não contratos, relatórios e ofícios, géneros literários cujo protocolo eu desconhecia. Esta nova condição está, paulatinamente, a embotar-me o espírito, mas também me tornou sensível a aspectos e minudências para que, ainda há escassos meses, não me encontrava preparado ou disponível. É o caso de um pequenino passo do famigerado solilóquio Ser ou não ser de Hamlet, no qual o jovem príncipe da Dinamarca pondera sobre o suicídio e sobre aquilo que dita o seu adiamento – a aterradora hipótese de, já cadáveres, continuarmos a desejar: «Pois, nesse sono da morte que sonhos virão…?» Não fosse este terror, não faltariam razões para darmos uso a «um punhal despido», assevera Hamlet. Que razões são essas, que justificariam o suicídio? No catálogo do herói, surge, logo após a aflição de um amor não correspondido, o desgosto administrativo: «as demoras legais, a insolência dos gabinetes…» Nos seus Silogismos da Amargura, o filósofo E. M. Cioran garante que esta foi «a coisa mais profunda que Hamlet disse». Estou consciente de que Hamlet disse muitas coisas profundas, mas, na taciturna celebração do meu primeiro aniversário como gestor público, inclino-me a concordar.

10/02/2019

«A morte será para mim bela…»*



Uma pergunta para o exame de Época Especial:
Por razão Antígona usaria esta t-shirt se fosse uma rapariga do nosso tempo?

* Sófocles – Antígona (Prólogo), trad. Marta Várzeas